quinta-feira, 8 de outubro de 2020

"Velho não quer trepar!"


Mulheres e homens mais velhos têm liberdade para escolher novos prazeres e projetos de vida  

         

                  ·         Mirian Goldenberg, antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio, é autora de "A Bela Velhice". Folha de S.Paulo, 1º de outubro de 2020

 

Apenas excepcionalmente eu insiro artigo de outros autores. Só quando me identifico bastante com o texto e julgo importante compartilhá-lo com o leitor que me acompanha. Tom Simões


 

COM o título “Velho não quer trepar e usar drogas, quer ser dono de casa”, matéria do Uol - repercutindo uma declaração dada no programa "Saia Justa", do canal GNT - mostrou que Rita Lee descobriu novos prazeres na velhice.

Aos 72 anos, ela disse que “trepou a vida inteira” e que agora tem vontade de ler mais, aprender coisas novas, pintar. Passou a gostar de lavar louça, arrumar a cama e outras tarefas “fantásticas”. “E hoje estou aqui, velha e dona de casa”, já que “fazer sexo e usar drogas” não lhe interessam mais.

A roqueira mais famosa do Brasil, que revolucionou comportamentos no século passado, não é a única que se aposentou do sexo.

Na minha pesquisa sobre envelhecimento e felicidade, muitos homens e mulheres confessam que o sexo deixou de ser uma prioridade em suas vidas e que descobriram novos prazeres na velhice. Ser “dono de casa” é um deles, principalmente para os homens que passaram a maior parte da vida mergulhados no trabalho.

Quando se aposentam, além de buscarem um novo propósito que dê significado às suas vidas, querem ter mais tempo com a família, esposa, filhos e netos. Muitos estão descobrindo que gostam de cozinhar, e aprenderam a lavar louça, passar aspirador e outras atividades domésticas.

Já as mulheres querem ter mais tempo com as amigas, fazer cursos, ir ao cinema e teatro, viajar, passear, rir e conversar. Querem ter tempo para cuidar de si, pois passaram a vida inteira cuidando dos outros. Mais velhas, descobrem que o tempo é um bem precioso e buscam aproveitar a liberdade tardiamente conquistada.

Há uma inversão interessante. Quando envelhecem, muitos homens ganham o mundo do afeto, da família e da casa, que não puderam usufruir antes pois se dedicaram integralmente ao trabalho. As mulheres ganham o mundo da liberdade e da amizade, que não puderam aproveitar quando mais jovens já que priorizaram o cuidado da família e da casa.

Apesar das perdas inevitáveis, eles demonstram que existem ganhos importantes com o envelhecimento. Sentem-se mais livres para escolher como usar o tempo com atividades e projetos que consideram mais significativos. O lema deles poderia ser: “Eu não preciso mais, mas eu quero!”

Por que tanta dificuldade para aceitar que “velho não quer trepar” ou, melhor, que nem todos querem? Será que é porque não conseguimos enxergar outros aprendizados e propósitos tão ou mais gratificantes do que o sexo?

 

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