quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

‘VERDADE ABSOLUTA’ E ‘MEIA VERDADE’: VALE A PENA REFLETIR


Tom Simões, jornalista, www.tomsimoes.com, dezembro 2018






EM ARTIGO publicado na Folha de S.Paulo, caderno Ilustríssima, ‘Descontruindo Olavo de Carvalho’, 2/12/2018, Ruy Fausto, professor emérito do Departamento de Filosofia da USP, escreve: “As boas almas acham que tudo vai ser normalizado no Brasil depois da eleição de Jair Bolsonaro. A ordem é pacificar, reduzir as diferenças ou fazer oposição... Construtiva. Afinal, seria preciso manter a cabeça fria. E se as coisas não se passassem exatamente assim?”.

Veja bem, leitor. Não há aqui interesse da minha parte em questionar o atual cenário da política brasileira. Como descreve Sérgio Dávila (‘Que a esperança não seja em vão’, Folha de S.Paulo, 16/12/2018), parece razoável supor que o próximo ano será de esperança. “Espera-se que o presidente eleito, Jair Bolsonaro, aja segundo seus discursos de vitória e diplomação, não de acordo com a retórica de campanha e suas declarações extremistas do passado. Que ele faça um bom governo para os 210 milhões de brasileiros, não apenas para os que o elegeram, respeitando a Constituição e o estado democrático de direito [...]”.


Começo a reflexão citando um fato político atual que se encaixa adequadamente neste compêndio sobre a ‘verdade absoluta’ e a ‘meia verdade’. No meio futebolístico também é comum esse conflito por conta do fanatismo das torcidas. E é, claro, igualmente, na religião.

O que inspirou-me a escrever sobre o assunto foi o comentário de um amigo no Facebook sobre uma ‘meia verdade’ que publiquei, tendo como foco o jogador português Cristiano Ronaldo, à qual o amigo reagiu negativamente, sustentando outra ‘meia verdade’ sobre o futebolista. Aceitei-a humildemente. Disse-lhe então que ‘uma meia verdade não elimina outra meia verdade’.

A essência da verdade é de outra ordem. Ela não pode ser passada pela metade. Os que não podem conhecer a ‘verdade total, a verdade absoluta’, alimentam-se com as ‘meias verdades’. 

Não há dúvida que alimentamos freneticamente muitos discursos por hipóteses duvidáveis, suposições consideradas válidas antes de sua confirmação. Há uma tendência de avaliarmos situações segundo as próprias opiniões, intenções, ideias preconcebidas, preconceitos, ignorância... ‘Achismo’ é uma gíria sobre algo criado por alguém com base unicamente em suas opiniões e intenções, sem nenhum tipo de argumentação concreta. Trata-se de uma justificativa ou conjunto de ideias que se baseiam tão somente na subjetividade, na opinião pessoal.

Somos empurrados para duas possibilidades: acreditar piamente naquilo que é disseminado, ou duvidar de tudo e viver numa incerteza permanente, diz alguém.

Pior do que não saber é pensar que se sabe! Cresce o número dos que, nada tendo lido ou estudado sobre um assunto técnico ou científico, discutem a respeito com a intransigência própria de quem desconhece sua limitação. “Que saudade do tempo em que, quem mais sabia, declarava como Sócrates: ‘Apenas sei que nada sei!’. Só quem muito sabe é capaz de perceber o quanto há ainda por aprofundar. Só quem respeita o conhecimento se coloca com humildade frente ao saber e à pesquisa”, escreve a filósofa e escritora Tania Zagury (1).  

“Uma meia verdade é uma declaração enganosa que inclui algum elemento de verdade. A declaração pode ser parcialmente verdadeira ou completamente verdadeira, mas apenas parte da verdade total pode utilizar algum elemento enganoso, como pontuação indevida ou duplo sentido, especialmente se a intenção for enganar, iludir, culpar ou deturpar a verdade”, cita a enciclopédia Wikipédia (2).

De acordo com a enciclopédia, o propósito ou a consequência de uma meia verdade é fazer algo que é apenas uma crença parecer ser uma verdade comum, ou uma declaração verídica para representar toda a verdade, ou, eventualmente, levar a uma falsa conclusão. Segundo a teoria da crença verdadeira justificada no conhecimento, para saber que uma proposição é verdadeira não basta apenas acreditar na relevância da proposição, mas também ter uma boa razão para fazer isso. A meia verdade engana o destinatário pela apresentação de algo acreditável e usa isso para fazer com que seja um bom motivo para crer que a declaração é verdadeira por inteiro, ou que a declaração representa a verdade completa. 

A ‘meia verdade’ é uma afirmação que não é falsa, mas em que se oculta alguma informação. Na verdade, ela é usada para enfatizar ou confirmar algo que é dito pela emoção com muito efeito.

Por outro lado, conforme demonstra o professor Robert Feldman da Faculdade de Psicologia da Universidade de Massachusetts (3), muitas das nossas conversas mais comuns estão cheias dessas mesmas verdades incompletas. No entanto, 98% delas são inofensivas, não prejudiciais e até funcionais (como dizer a uma pessoa com quem não tenhamos muita confiança que “estamos bem, tirando isso e aquilo”, quando na verdade estamos passando por um momento delicado).

“Não existe covarde pior do que o que faz uso constante da meia verdade. Porque quem conjuga a verdade com a falsidade mais cedo ou mais tarde mostra a mentira completa, porque os enganos camuflados com boas maneiras são prejudiciais e desgastantes, e costumam vir à tona, assim como as mentiras inteiras.”

Dizia Miguel de Unamuno, 1864-1936, filósofo espanhol, que não existe tolo bom, que todos, a seu modo, sabem como conspirar e implantar truques eficazes para nos pegar desprevenidos. Mas se há algo que existe excessivamente na nossa sociedade não são precisamente os tolos nem os ingênuos. A mentira incompleta ou a ‘meia verdade’ é a estratégia mais familiar que vemos em quase todos os nossos contextos, principalmente nas esferas da política.

Em "O jornalismo dos anos 90", o jornalista Luis Nassif (4) escreve um capítulo sobre as ferramentas de manipulação da notícia pela mídia. “Um dos recursos poderia ser batizado de ‘o jogo de juntar pontos’. Como no jogo, jogam-se vários pontos em uma página em branco. Alguns pontos são verdadeiros - e nem por isso relevantes. Com base nos pontos verdadeiros, o repórter ‘investigativo’ junta os outros pontos formando o desenho que bem entender, mesmo que todos os demais sejam falsos.”
“Entendo por razão, não a faculdade de raciocinar, que pode ser bem ou mal utilizada, mas o encadeamento das verdades que só pode produzir verdades, e uma verdade não pode ser contrária a outra”, escreveu Wilhelm Leibniz, 1646-1716, filósofo, cientista e matemático alemão.



O que é a Verdade?


Como explica Dieter F. Uchtdorf (5), o apóstolo Paulo disse que como neste mundo a luz é obscura, vemos apenas parte da verdade, como se olhássemos ‘por espelho, em enigma, por adivinhação”. Contudo, parece fazer parte de nossa natureza humana adotar pressupostos em relação a pessoas, política e religião, com base em nossa experiência pessoal, que muitas vezes é equivocada e incompleta.
“Com muita frequência confundimos crença com verdade, achando que se algo faz sentido ou é conveniente deve ser verdade. Por outro lado, às vezes deixamos de acreditar na verdade ou a rejeitamos porque ela exige que mudemos ou que admitamos estar errados. Com frequência, a verdade é rejeitada porque não parece ser coerente com o que vivenciamos antes”, reforça Dieter. 
Para ele, alguns, porém, não buscam a verdade com tanta determinação quanto se empenham em impor a sua opinião. Não buscam sinceramente aprender, mas desejam discordar para mostrar sua suposta erudição. “Quando as opiniões ou ‘verdades’ de outros contradizem com as nossas, em vez de levar em consideração a possibilidade de haver informações que poderiam ser úteis e que ampliariam ou complementariam o que sabemos, com frequência tiramos conclusões apressadas ou fazemos suposições de que a outra pessoa está mal-informada, mentalmente perturbada ou até conscientemente mal-intencionada.”
Infelizmente, essa tendência pode se espalhar para todas as áreas de nossa vida: desde os esportes até os relacionamentos familiares, e da religião à política.

Verdade Absoluta 
Soares Netto (6), especialista em marketing digital em redes sociais e tecnologia da informação, interroga: “Quem disse que só existe uma verdade absoluta e que tudo que foi criado irá para sempre existir? A nossa vida é uma completa evolução e cada dia mais acelerada. Quantas pessoas ‘brigam’ por algo que, mais tarde, pode se tornar um nada? Imagine quantas pessoas estão presas em um único pensamento e sequer ousam admitir um pensamento diferente? Para derrubar uma ‘verdade corrente’ e manter uma linha de pensamento inovadora é preciso dedicação, estudos, leitura e, acima de tudo, humildade. O recomendável é não ficarmos engessados em nossa vida, em nossos estudos ou até mesmo em nossas convicções. Devemos aprender a sair da nossa ‘zona de conforto’ e descobrir o mundo que existe lá fora. Isto serve até mesmo para as leis. Sim, nem mesmo as leis são absolutas e estas devem se amoldar ao seu tempo. A vida segue, evolui e o mundo gira constantemente. Os intransigentes e intolerantes evoluiriam bastante se atinassem para a sabedoria de Nietzsche: não existem fatos eternos, não existem verdades absolutas. Avante!


Significado de Verdade


Para a corrente filosófica conhecida como relativismo (7), a verdade é relativa, ou seja, não existe uma ‘verdade absoluta’ que se aplique no plano geral. Assim, a verdade pode se aplicar para algumas pessoas e para outras não, já que depende da perspectiva e do contexto de cada um.
A ‘verdade absoluta’ é aquela que é verdade todo o tempo e em todos os lugares. O que é verdade para uma pessoa é verdade para todos. Exemplo: “Todos precisam de ar para respirar. As pessoas não podem viver ao mesmo tempo no passado e no futuro”.

(Autor desconhecido)


Para o poeta e filósofo português Fernando Pessoa, 1888-1935, (8), “A verdade existe dentro das minhas sensações. Ficamos portanto com as nossas sensações por única ‘realidade’, inútil que realmente tem aqui certo valor, mas é uma conveniência parafrasear. De ‘real’ temos apenas as nossas sensações, mas ‘real’ (que é uma sensação nossa) não significa nada, nem mesmo ‘significa’ significar qualquer coisa, nem sensação tem um sentido, nem ‘tem um sentido’ é coisa que tenha sentido algum.”


“HÁ três verdades absolutas (9). A verdade absoluta não depende da opinião pública ou da popularidade. Uma das verdades absolutas: todos nós morremos. Todos nós nascemos da união entre um homem e uma mulher. Nascemos de uma mulher.” 



O ponto de vista de uma pessoa é tão válido quanto o de qualquer outra pessoa. Nós todos temos a nossa própria verdade.

Como moderar então as nossas possíveis ‘verdades’? Despertando a consciência no sentido da ‘sensatez’. Todo o restante vem naturalmente quando a consciência se expande. Trata-se de um longo caminho a ser percorrido e que exige a reinvenção de cada um. Pois que as pessoas não precisam ser sábias, ou inteligentes, basta que sejam sensatas. “Só os homens sagazmente ativos, que conhecem as suas aptidões e as usam com medida e sensatez, poderão fazer avançar substancialmente o mundo", enunciava Johann Goethe. A sensatez (10) é uma qualidade dos indivíduos que vivem de forma equilibrada e são guiados pelo bom senso. Eles costumam ponderar antes de tomar atitudes ou dar opiniões e, com isso, cometem menos erros do que aqueles que agem de forma impensada. Por isso, entender o que é uma pessoa sensata é importante para que se reflita a respeito do seu próprio comportamento e identifique os pontos que precisam ser aperfeiçoados para que se torne mais prudente e consiga atingir os seus objetivos com mais assertividade.

Comece a manifestar compreensão, ou ao menos interesse, pelas verdadeiras causas, ao invés de negação emotiva e julgamento, que não têm a menor serventia. Muitas vezes passamos por intolerantes, ‘donos da verdade’, sem perceber que muitas pessoas nos evitam, e nem sabemos disso! “Ah, não, de novo aguentar a mesma ladainha?...”  Pessoas que se consideram donas da verdade não poupam argumentos para provar que seu ponto de vista é sempre o certo.   

‘Sensato’ é ainda a expressão que qualifica aquela pessoa que é discreta, que é reservada em suas palavras e em seus atos. A importante frase do filósofo grego Aristóteles ressalta o valor da sensatez: “O ignorante afirma, o sábio duvida, o sensato reflete”.

Vamos refletir sobre a difícil convivência com os que se acham sempre certos! Quem não tem alguém assim na própria família e na roda de amigos? As reflexões são para os poucos que podem compreender; os outros não se sentirão atraídos por elas. Trata-se de um assunto por demais abstrato! 




Algumas célebres citações sobre a verdade:





“NÃO há fatos eternos, como não há verdades absolutas.

Friedrich Nietzsche




“ÀS VEZES, a única coisa verdadeira num jornal é a data.

Luis Fernando Verissimo




“AS PESSOAS que falam muito, mentem sempre, porque acabam esgotando seu estoque de verdades.

Millôr Fernandes

  


  

“EXISTEM pessoas com convicções firmes
e com verdades absolutas.
Essas pessoas não acham nada engraçado
este meu jeito de questionar, flexibilizar,
e colocar a dúvida sobre tudo.

Augusto Branco




“QUE não nos apossemos da verdade. Saibamos, existem diferentes pontos de vista e as nossas verdades não são absolutas.

Lázaro de Souza Gomes







"NÃO existe verdade absoluta", já dizia Platão. Esse seria o primeiro item que gravaria em mim para nunca mais esquecer. Não existe verdade absoluta, assim como não existe certo e errado. O que existe é o ser humano, sua consciência e seu enorme leque de escolhas. Em segundo lugar, quero lembrar-me sempre que a vida não está no nosso trabalho, nas nossas festas e nem nos planos que fazemos para o futuro. A vida é o que acontece a cada segundo, a cada respiração, a cada sentimento. E nós somos essa experiência diária. Somos a liberdade do vento que nos corta, a imensidão do céu e a grandeza do amor. Nós somos a parte mais complexa e mais intensa do Universo. E que Universo!
Olho em volta e consigo enxergar uma magia em tudo o que acontece. Até naquelas situações que avaliamos como negativas. Pare e veja! Se prestarmos atenção veremos que tudo que acontece é uma pecinha que completa um quebra-cabeça. E que a cada peça ele vai tomando forma. É como se cada passo nosso estivesse interconectado com uma lei própria, cronometrado em uma sincronia incrível. Os amigos, os amores, a família... A vida vai dançando a música que escolhemos com uma melodia harmônica. E é essa a percepção que proporciona a alegria de viver. A alegria de ser único, inteiro e completo. E também de poder acrescentar, de ser parte de algo maior e muito além de nossa compreensão racional. As opções estão aí.
Escolhi como verdade as palavras que escuto nas entrelinhas e no silêncio.
Escolhi que o certo é o que o coração fala e a cabeça pondera.
Escolhi ser a parte do universo que acredita e que é feliz simplesmente por existir.

Nayara Mesquita Caiafa, coordenadora de marketing







  
“NÃO existem verdades absolutas.
Cada um enxerga o que quer ver. De nada adianta tentar mostrar sua verdade a quem está convicto em acreditar na mentira que lhe convém, no que lhe é suportável, sob o título de verdade. Mais que perda de tempo, é perda de paz!

Branca Quinol




“A VERDADE absoluta, que coisa aflitiva, afinal. Porque se se não tem, como ordenar a vida que é nossa? Mas se se tem, como não anular a vida dos outros que são contra ela?

Vergílio Ferreira








"EM tudo na vida existem dois pontos de vistas possíveis, e nenhum deles é a verdade absoluta".

Juli Zeh




"EXISTEM pessoas que dizem que a Bíblia é irrefutável e verdade absoluta, dizer isso sem nunca ter lido ou estudado o Torá, Alcorão, Mahabharata, Bhagavad Gita ou outros é o mesmo que passar a vida toda comendo no restaurante perto de casa e dizer ser a melhor comida do mundo; na sua concepção estará correto, mas isso não significa que seja verdade...

Rafael Zucco




“NÃO tente colocar os seus pensamentos e ideias como verdades absolutas. A verdade nem sempre é a resposta que buscamos, é por vezes, arma dolorosa que fere tanto quanto a mentira; por isso, busque apenas o conhecimento. Saber do que você precisa já pode livrá-lo de muita coisa ruim.
E cuide dos seus atos, são eles que formam o que você está vivendo, e atraem semelhantes coisas para a sua eternidade. Somos o que fazemos repetidamente. A excelência não é um ato, mas um hábito.

Aristóteles







NÃO existe uma verdade absoluta , o saber vive uma metamorfose constante e muda de acordo a evolução individual.

Ronaldo David Segundo




“AS VERDADES diferentes na aparência são como inúmeras folhas que parecem diferentes e estão na mesma árvore.

Mahatma Gandhi




"SE considerarmos que a verdade absoluta não existe, pense que a sua verdade pode ser apenas uma opinião, e que pode ser seguida ou não".

Valdeci Santos




“A MELHOR forma de não aprender é ter as próprias opiniões como verdades absolutas.

Gilliard Oliveira de Souza




A VERDADE, assim como a arte, não são absolutas, mas apenas conceitos temporais.

Fátima Silva Alcântara






            ·        Fontes de Consulta


(1)   A era do achismo, https://oglobo.globo.com/opiniao/a-era-do-achismo-20979356



(4)   Uma explicação sobre a meia verdade jornalística, Luis Nassif








           ·         Revisão gramatical do texto: Daisy Rodrigues de Lima Simões

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