“O que
mais se sabe dos segredos é que guardá-los não é saudável para o cérebro”,
escreve David Eagleman (neurocientista, nascido
em 1971) em sua obra “Incógnito – As
vidas secretas do cérebro”.
Nesse
livro, Eagleman cita o psicólogo James Pennebaker e colaboradores, que
estudaram o que acontece quando vítimas de estupro e incesto, agindo por vergonha
ou culpa, preferem guardar segredo. “Depois de anos de estudo, Pennebaker
concluiu que ‘o ato de não discutir
ou confidenciar o evento com outros pode ser mais prejudicial do que ter vivido
o evento per se’. De acordo com
Eagleman, o psicólogo e sua equipe descobriram que, quando os participantes
confessavam ou escreviam sobre seus segredos bem guardados, sua saúde
melhorava, o número de consultas ao médico declinava e havia um decréscimo
mensurável em seus níveis de hormônio de estresse.
Os
resultados são bem claros, relata David Eagleman, “mas alguns anos atrás
comecei a perguntar a mim mesmo como compreender essas descobertas do ponto de
vista do cérebro. E isto levou a uma questão que percebi que não era abordada
na literatura científica: o que é um segredo, da perspectiva da neurobiologia?
Imagine construir uma rede neural artificial de milhões de neurônios
interligados – como um segredo seria ali? Temos sistemas científicos úteis para
compreender a doença de Parkinson, a percepção das cores e a sensação de
temperatura – mas nenhum para entender o que significa para o cérebro ter e
guardar um segredo”.
O autor
explica que, no sistema da equipe de rivais, um segredo é facilmente
compreendido: é o resultado da luta entre partidos concorrentes no cérebro.
“Uma parte do cérebro quer revelar alguma coisa, outra parte não quer. Quando
há votos conflitantes no cérebro – um para contar, outro para guardar -, isto
define o segredo. Se nenhuma parte se importa de contar, é apenas um fato
tedioso; se as duas partes querem contar, é uma boa história. Sem o sistema da
rivalidade, não teríamos como compreender um segredo. O motivo para um segredo
ser vivido conscientemente é que ele resulta de uma rivalidade. Não é
corriqueiro.”
Outro
ponto interessante, para Eagleman, é que o principal motivo para não se revelar
um segredo é uma aversão às consequências de longo prazo. “Um amigo pode pensar
mal de você, ou um amante pode ficar magoado, ou uma comunidade pode colocá-lo
no ostracismo. Esta preocupação com o resultado é evidente pelo fato de que é
mais provável que as pessoas contem seus segredos a completos estranhos; com
alguém que você não conhece, o conflito neural pode ser dissipado sem custo
nenhum. Por isso os estranhos podem ser sociáveis nos aviões, contando todos os
detalhes de seus problemas conjugais, e por essa razão os confessionários
continuam a ser um importante elemento de uma das maiores religiões do mundo.
Pode explicar também o apelo da oração, em especial naquelas religiões que têm
muitos deuses pessoais, deidades que emprestam os ouvidos com uma atenção
indivisa e um amor infinito”, descreve o neurocientista.
Como
ele exemplifica, esta necessidade ancestral de contar segredos a um estranho
pode ser encontrada, recentemente, na forma de websites como o postsecret.com, onde as pessoas revelam
anonimamente suas confissões.
E tem
algo muito importante em tudo isso: “Conta-se um segredo em geral pelo próprio
bem, e não como um convite para um conselho. Se o ouvinte vê uma solução óbvia
para um problema revelado pelo segredo e comete o erro de sugeri-la, isto
frustrará quem o conta – e ele realmente queria
contar. O ato de contar um segredo pode ser em si a solução. Uma questão em
aberto é por que o ouvinte dos segredos deve ser humano – ou semelhante a isso,
no caso das deidades. Contar seus segredos a uma parede, um lagarto ou uma
cabra é muito menos satisfatório”, arremata o autor.
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