Temos toda a informação do mundo, mas a crise que enfrentamos
mostra que não temos tanto conhecimento
LÊ-SE DIARIAMENTE o
jornal para ficar bem informado, ou por simples curiosidade. O leitor comum
explora bastante o noticiário, mostrando-se sempre atualizado, gostando de
discutir com amigos os destaques jornalísticos. É claro que, por conta da
natural divergência de opiniões, não raramente discussões geram
desentendimentos, na maioria das vezes passageiros, por conta de cada um querer
fazer valer seu ponto de vista.
Então, eu pergunto: O que
alguns cidadãos comuns bem informados, e também diariamente revoltados com o
que as manchetes divulgam, acrescentam de produtivo à comunidade, ao País e ao
planeta? Pergunto se esses indivíduos estão engajados em alguma ação social
desvinculada do interesse pessoal.
Criticar sempre é mais
fácil (e inútil, na maioria das vezes). E a mídia se esforça para alimentar a
revolta do leitor. Não lhe interessa destinar algum espaço, estratégico e
frequente, para educar e levar o leitor ao autoconhecimento. Porque não se
trata apenas de o leitor criticar e se revoltar, mas de aprender a construir
argumentos sensatos e convincentes e mostrar o que faz desinteressada e
efetivamente por um mundo melhor. Para mudar o mundo é preciso mudar a
mentalidade. Não adianta se revoltar, e com pouco ou nada contribuir. Melhor
então se calar e se informar, reunindo argumentos sensatos para, por exemplo,
escolher um bom candidato para as próximas eleições.
Cada um de nós deve ser
capaz de observar a si mesmo, de refletir e descobrir um propósito elevado. E,
corrigindo desvios, servir de modelo, influenciando a comunidade com as quais
convivemos, especialmente a partir da reavaliação de nossas crenças e
comportamentos. Pois, ao modificá-los, podemos modificar o mundo. O
autoconhecimento, obtido pelo exercício da reflexão, permite-nos rever e
modificar nosso padrão de desempenho humano.
Visando plasmar bons
comportamentos, a televisão, por exemplo, poderia introduzir em suas novelas
personagens capazes de influenciar positivamente o telespectador, fugindo ao
meramente caricato, ou insano, ou desleal. Imagino, por exemplo, um personagem
morador de rua, representado de tal forma que ajudasse o telespectador a mudar
as crenças negativas, os preconceitos contra essas pessoas. Mas o
telespectador, por sua vez, infelizmente, prefere deixar-se entreter apenas por
programas de má qualidade, amortecendo a sua participação na realidade.
E o que dizer do sermão
objetivo de um padre? Livre das repetitivas citações eclesiásticas, ele bem que
poderia influenciar positivamente um grande número de pessoas, não? Porém, por
experiência própria ao longo dos anos em que frequentei a Igreja, eu não sinto
que a retórica comum dos padres ainda seja comumente capaz de mudar
efetivamente para melhor o comportamento da maioria dos fiéis.
Lendo “Educação do homem integral”, escrito por
Huberto Rohden (1893/1981), renomado
filósofo, educador e teólogo catarinense radicado em São Paulo, assinalei: “Nos
tempos modernos acresce a facilidade de difusão pela rádio-televisão, que
dispensa o telespectador de pensar – basta ver, ouvir e sentir. E não é somente
a educação, mas até a instrução, sofrem o impacto dispersivo desses programas
de televisão. A ciência e técnica
progridem a passos de gigante, ao passo que a moral e a ética continuam
estagnando ou até retrogradando. Felizmente nos últimos anos se observa, ao
menos numa elite da humanidade, um interesse crescente por uma literatura mais
sadia e mais condizente com os valores humanitários do que com os instintos
inferiores do homem.”
Segundo Rohden, o
educador e o educando de hoje têm de nadar contra a corrente. Mas o pouco que
alguém consegue contra a corrente vale mais que o muito dos outros que vão à
mercê da corrente. As coisas fáceis são dos covardes – as coisas difíceis são
para os heróis.
“Mas, se nem o governo
nem as igrejas estão em condições de iniciar esses novos rumos para a educação,
devem pessoas, isoladamente ou em grupos sem preconceitos, realizar essa
educação verdadeira. Ser cosmicamente humano é a suprema aspiração da
verdadeira educação, cuja base é a autorrealização, transbordamento espontâneo
do autoconhecimento”, complementa o filósofo.
“Minha força suprema! Como as pessoas perdem tempo na vida!”, imaginava o filósofo
Rohden.
JORNALISMO CULTURAL
Ademir Assunção, autor de “Faróis
no caos”, critica o modelo atual de jornalismo cultural e a forma de
cobertura da imprensa, que classifica como cada vez mais refém da indústria das
celebridades. Entrevistado por Douglas Gavras, “Livro reflete sobre cultura e jornalismo” (Folha de S.Paulo, Ilustrada,
28/8/2012), Ademir diz que o jornalismo às vezes se preocupa apenas em vender
discos, shows e ideologias, e não ideias, contar histórias e transmitir
conhecimento. Para ele, é preciso que o repórter retome seu papel de ir à rua
em busca de personalidades “com algo a dizer”.
Tudo o que Ademir
escreveu em “Faróis no caos” foi feito nos tempos da Redação, com a pressão
diária. “É possível, sim, fazer um jornalismo diferente, é só querer”, revela.
Alguns jornalistas
poderão dizer que existem veículos focados nas mais diferentes áreas do conhecimento.
Ocorre que o grande público não tem acesso ou não se interessa pelo jornalismo cultural.
Por isso, o item “educação e reflexão positiva” do leitor tem de estar sim
embutido em manchetes diárias. O jornal “Folha
de S.Paulo” tem experiências neste sentido, principalmente em alguns
domingos, talvez pela ausência de assuntos mais polêmicos, não importa. Importa
o destaque em primeira página que esse veículo dá a um assunto capaz de
sensibilizar positivamente o leitor.
EXCESSO DE INFORMAÇÃO
“Todos nós sentimos, de
alguma forma, que estamos num período de grandes transformações, tanto
internamente quanto no mundo que nos cerca. Há grandes avanços tecnológicos,
mudanças climáticas e velocidade espantosa na transmissão de informações, mas a
humanidade se apresenta cada vez mais angustiada, ansiosa, com uma incidência
de doenças crônicas e psicológicas sem precedentes”, citam Bruce H. Lipton (autoridade internacionalmente reconhecida por seu
trabalho, que reúne ciência e espiritualidade, e especialista em biologia
celular) e Steve Bhaerman (cientista
político) em sua obra “Evolução
espontânea”. Nos últimos sete anos, eles sentiram a necessidade cada vez
maior de escrever o que aprenderam e publicar um livro.
De acordo com essa obra,
a humanidade está cada vez mais conectada. “A demonstração óbvia é o advento da
Internet, que nos permite enviar e receber mensagens de qualquer parte do mundo
com a velocidade da luz. Essa forma de comunicação transformou o planeta em uma
aldeia. Tudo está relacionado e emaranhado. Parece que a ciência escalou a
montanha inteira do conhecimento só para encontrar Buda sentado no topo”.
Aliando o conhecimento
científico de Bruce e o conhecimento de ciências políticas de Steve, os autores
notam que as descobertas da ciência moderna e os antigos ensinamentos dos
grandes líderes espirituais convergem para um mesmo ponto: este é um mundo de
relacionamentos. “Ninguém consegue ficar de fora. Estamos todos implicados
nisso. E, claro, compreendemos que os velhos padrões de pensamento e de visão
de mundo não podem mais nos ajudar a caminhar. Nossa sobrevivência está em jogo. Precisamos
urgentemente de um novo paradigma.”
Para esses escritores,
doses maciças de informação não nos tornam mais sábios. “Para não manter o foco
na crise em que vivemos, somos convenientemente encorajados a viver distraídos
entre informações e vícios diversos, que nos tornam passivos e preocupados com
detalhes insignificantes. Mas a realidade não deixa de existir. Todos os
acontecimentos no mundo aparentemente se encaminham a uma inexorável crise de
proporções incalculáveis. Quem tem filhos e netos começa a se preocupar com o
tipo de mundo que deixará para eles.”
E mais, igualmente
importante: “A humanidade moderna se orgulha de seu conhecimento sobre o
Universo e sobre a vida. Somos a geração mais bem ‘educada’ (grifo meu, Tom
Simões) e informada da história. Realmente, sabemos muito. Mas o que
fazemos com toda essa informação? Temos toda a informação do mundo, mas a crise
que enfrentamos mostra que não temos tanto conhecimento. O problema não é a
informação em si, mas a maneira como a interpretamos”, revelam os autores.
Enfim, copiando Bruce e
Steve: estimados leitores, se eu puder ajudá-los a se tornarem mais conscientes
sobre a vida, é sinal que há esperança para o mundo. Os mais jovens herdarão
este mundo, e espero, com estas minhas reflexões, estar contribuindo para
torná-lo um lugar melhor.
___________
* Tom Simões, tomsimoes@hotmail.com, especializado
em jornalismo científico, Santos (São Paulo, Brasil)
Parabéns pelo trabalho, são poucos blogs ou sites jornalísticos que se posicionam de tal maneira. Como aluna de terceiro ano do ensino médio e em ano de vestibular, vejo em suas postagens um pacote de informações que valem ouro, muito obrigada!
ResponderExcluir"Não adianta você saber um monte de coisas, ser informado na superficialidade midiática sem uma compreensão do mundo. Você só reproduz, não consegue mais produzir. [...] A literatura passou a ser pautada pelo gosto da média. Mas literatura é reflexão, não só produto de consumo, não só contar uma história. Tem um elemento de rebeldia, de criação. Minha literatura sempre teve uma coisa de briga, de ser do contra, mas também sempre tive a ambição natural de querer ser lido." Bernardo Carvalho, 53, escritor, autor de "Reprodução", Cia. das Letras (entrevista: Raquel Cozer, Folha de S.Paulo, Ilustrada, 21/9/2013)
ResponderExcluir“GENIAL a crônica “Me dê motivos”, de Antonio Prata (‘Cotidiano’, 29/9/2013). Assim como as reportagens sobre o cão Beethoven e o sabiá laranjeira, esses textos oxigenam o jornal, tão carregado com mensalão e corrupção, trazendo-nos de novo ao cotidiano das pessoas normais e honestas.”
ResponderExcluirCelso M. Guerra (Araras, SP), Folha de S. Paulo, Painel do Leitor, 30/9/2013