Lamento a perda de oportunidade da igreja católica de transformar
verdadeiramente os seus fieis devotos
A PRINCÍPIO, este texto se
destinava a um comentário meu sobre uma frase inserida no Facebook: “Ser bom por medo de punições não é uma
virtude”, ilustrada com a imagem de um sacerdote celebrando a Missa. Mas
depois resolvi transformá-lo em um artigo.
Fui ‘criado’ na igreja
católica. Quando criança, até o começo da adolescência, frequentei a Cruzada
Eucarística, varria a igreja, contava as doações dos fieis... Padre Antonio,
espanhol, pároco da igreja que eu frequentava, quando no retorno de uma visita
a seu país, chegou a me presentear com chocolate da Espanha. Mas quando comecei
a questionar a religião, ficando sem algumas respostas lógicas para mim,
afastei-me, obtendo respostas satisfatórias em outras práticas
filosófico-religiosas. Ainda aprecio o templo católico, mas de preferência
vazio de pessoas, quando posso respirar a espiritualidade subjacente nesse
espaço. Quando frente a um sacerdote especial, daqueles que irradiam uma
espécie de luz e suavidade num primeiro momento, aprecio também alguns de seus
rituais.
Há algumas semanas,
compareci a uma Missa de Sétimo Dia. Confesso que a encenação do ritual naquela
Igreja deixou-me um tanto incomodado. O padre e os cantores, ao longo de toda a
celebração, cantavam ao microfone, resultando em um som demasiadamente alto. E
o sermão do pároco em nada mudou com o passar dos anos. Para mim, a música num
templo tem de ser branda, acolhedora; ela é uma espécie de terapia ligada à
espiritualidade. Entrei e saí da igreja sem ser positivamente provocado, sem
ouvir algo que pudesse levar-me a refletir e, quem sabe, a alguma mudança
afirmativa de comportamento. Por outro lado, acostumado com a simplicidade e o
silêncio do templo budista, que leva ao aquietamento da mente, não consegui
relaxar naquela Missa para tentar uma busca pelo transcendental. O canto em
alto som distraía muito, provavelmente impedindo a concentração dos devotos.
Acredito que o ritual assim praticado, hoje possivelmente frequente em muitas
das igrejas, distraia bastante os fieis. As igrejas evangélicas também se utilizam
muito da música em alto volume para envolver os fieis. Às vezes me pergunto se
não seria uma estratégia de amortecimento, levando os praticantes à falsa ideia
de que cumpriram suas obrigações religiosas, mas na verdade impedindo o
mergulho no Ser Divino presente em cada um de nós. Mesmo porque este mergulho
pode ser libertador frente a dogmas e tutores sacerdotais.
Lamento então a
oportunidade que perdem as igrejas, dentre elas a Católica, de transformar
verdadeiramente os seus fieis devotos. Penso então se essa Igreja não estaria,
assim, deixando de promover transformações em seus fieis, esse grande número de
pessoas que frequenta assiduamente as paróquias. É evidente que não devo
generalizar. Há certamente paróquias especiais que contribuem verdadeiramente
para a modificação de percepção, ou seja, para promover coletivamente a
capacidade de mudar, imprescindível para o amadurecimento pessoal, de forma a
tornar os fieis mais compreensivos e generosos com a família, amigos, colegas
de trabalho, vizinhos e à comunidade em geral. Pessoas
podem vivenciar mudanças profundas de comportamento em templos. Esta sim é
a verdadeira função dos espaços sagrados. É neste particular que, a meu ver, a
Igreja Católica precisa se transformar.
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Revisão do texto: Márcia Navarro Cipólli, navarro98@gmail.com, e Roberto da Graça
Lopes
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