Destinado
aos meus filhos Ana e Guilherme
EM JANEIRO de 2000, aos 52 anos,
iniciei um registro de vida. Hoje, lamento não ter começado mais cedo. Imagino
quanta coisa deixei de escrever até então. Não raramente, surpreendo-me com
detalhes de alguns registros. Daí eu pensar que bom seria ler textos sobre a
minha infância, adolescência...
Considero a coletânea o maior legado a
meus filhos. Posso deixar um e outro imóvel, algum dinheiro... Mas esse legado
não pode ser avaliado materialmente; ele não tem preço. Quem sabe um dia os netos
poderão ler um pouco da minha história. Uma história que não visa simplesmente
uma autocontemplação, mas uma possibilidade de autorreflexão e facilitação para
melhorar a própria vida e a vida dos outros.
O que é um legado? Segundo o Dicionário
Houaiss de Língua Portuguesa, 2004, legado é a disposição de última vontade
pela qual o testador deixa a alguém um valor fixado ou uma ou mais coisas
determinadas. O que é transmitido às gerações que se seguem...”
Em sua obra “Transformando Suor em
Ouro”, que li em 2008, Bernardinho aborda o pai: “Mais que pai, o meu foi
sempre um modelo de caráter, de lealdade, de ética, de respeito às pessoas. São
coisas que não se compram, pois não estão à venda. Foi em seu livro ‘Andanças e
Caminhadas’, uma coletânea de textos diversos, que conheci muitos dos lemas
positivistas que influenciaram minha vida”.
Paralelamente a registros pessoais,
minha coletânea é enriquecida com sínteses dos livros e textos em geral que
leio. Sínteses que utilizo regularmente como referência nos artigos que produzo
para o blog e outros veículos. São citações de autores com os quais me
identifico bastante e recomendo ao leitor interessado no autoconhecimento e na
permanente renovação.
Lá numa página da coletânea guardo algo
de Gabriel García Márquez: “Ninguém se recordará de ti por teus pensamentos secretos.
Pede ao Senhor força e sabedoria para expressá-los. Demonstra a teus amigos e
entes queridos quanto eles são importantes”.
O MELHOR LIVRO...
Em sua obra “Um Pássaro em Voo”, cita
Osho, filósofo indiano: “... Uma pessoa religiosa sempre está além do livro;
uma consciência religiosa nunca é viciada nas palavras e no texto. Tudo é
infantil. Um homem religioso está à procura de experiências autênticas, não de
palavras pedidas emprestadas, não experiências dos outros”.
Assim, diz o filósofo, um mestre não
está interessado em lhe dar o livro certo. “Ele não existe. Não existe nenhum
livro certo, só existem pessoas certas e pessoas erradas. Um verdadeiro mestre
está interessado em deixar você de cabeça para cima. Um mestre está interessado
em mudá-lo, em mudar a sua pessoa; ele não está interessado em lhe dar um
livro”.
Olha só outro registro com o qual me
identifico, com base na obra “É Hora de Mudança”, de Deanna Beisser: “Antes de
deixar este mundo, quero contar a meus filhos algumas coisas muito importantes
sobre quem eu sou e em que acredito. Isso pode não fazer diferença no grande
esquema das coisas, mas, ao menos para mim, será como partilhar meu coração e
as verdades da minha alma. Quero que eles saibam que meu espírito dançou a cada
novo dia e beijou discretamente cada anoitecer, que eu os amei com todo o meu
ser, e que aonde quer que seus caminhos os levem, lá também estará o meu amor”.
CITAÇÃO
“A citação também pode servir como uma
provocação para a reflexão, não é simplesmente algo para demonstrar erudição”,
revela Geraldo Holanda Cavalcanti, 84, secretário-geral da Academia Brasileira
de Letras, no artigo “Imortal lança livro de referências poéticas”, de autoria
de Marcio Aquiles (Folha de S.Paulo,
Ilustrada, 11/5/2013).
Compêndio de mais de cinco décadas em
que coletou citações e referências sobre poesia, “A herança de Apolo” exprime o
universo de anotações e reflexões que Cavalcanti teceu ao longo da vida,
escreve o jornalista Aquiles.
Defensor da citação como procedimento
literário, Cavalcanti mostra como o método sempre foi útil para sistematizar o
conhecimento. Ao longo dos anos, os conceitos e definições foram registrados em
vários suportes: primeiramente nas fichas manuscritas, depois em folhas
datilografadas e, finalmente, em arquivos eletrônicos. (Eu também guardo os primeiros registros em folhas datilografadas)
“Aos 80 anos, descobri uma vontade de
pôr ordem em todas essas anotações, pois, quando leio, eu risco, tomo notas,
faço observações”, revela Cavalcanti.
Veja só a imaginação de Dalai-Lama:
“Acho que tenho uma capacidade especial: o modo como minha mente funciona. Acho
que tenho muita capacidade para ler um texto budista, captar a essência do que
está no livro e resumi-la bem. Acho que essa capacidade se deve em parte à
habilidade de colocar o material em um contexto mais amplo e, principalmente, à
minha tendência de relacionar o material à minha vida, de fazer uma conexão
comigo e com minha experiência pessoal, com minhas emoções”.
O propósito da minha coletânea é
sintetizar as muitas questões que considero essenciais para a conquista da paz
interior. É compartilhar os progressos obtidos ao longo da vida em termos de um
melhor conhecimento e entendimento do mundo para alcançar a verdadeira
felicidade.
Ficarei feliz se algumas experiências e
reflexões que compõem a minha história puderem transformar positivamente o
leitor, com base na reflexão de ideias, conceitos, valores e crenças que alicerçam
a história de personalidades que fazem a diferença.
Para concluir, escolho a obra “O Ócio
Criativo”, de Domenico de Masi, pág. 36, que li em março de 2004: “No Fedro, de
Platão, faz calor e Sócrates está sob um carvalho. Ele encontra uma fonte,
refresca as mãos, repousa à sombra e encontra ali a perfeita consonância entre
si e o que o circunda. Isto é dar ‘sentido’ às coisas. Sócrates não precisa de
nada mais, não é como Onassis ou Trump, que cortam o mar com seus iates e mil
acessórios. As poucas coisas que um
filósofo possui lhe bastam, já que ele sabe enriquecê-las de significado”.
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Revisão do texto: Márcia Navarro Cipólli, navarro98@gmail.com
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