“Todos somos repetidores. Só os gênios são originais.
E eles são cada dia mais raros”
E eles são cada dia mais raros”
Imagem: www.jornalvoxpopuli.com.br |
“CONTINUA-SE ESCREVENDO – ou, como dizem os portugueses,
continua-se ‘a escrever’. Por isso ou
aquilo, há dentro de cada ser humano um escritor potencial, ou seja, uma pessoa
que tem o gosto ou a necessidade de
transmitir aos outros a sua visão de mundo ou a sua história. Com o
advento da comunicação eletrônica, nunca antes - como diria Lula – tanta gente
está escrevendo na telinha dos computadores”, escreve Carlos Heitor Cony em sua
crônica “O fim do livro impressso” (Folha de S. Paulo, Ilustrada, 24/10/2008).
Mas a maioria das pessoas fala em demasia, e o que mais
incomoda é quando o assunto não é produtivo. Contam histórias detalhadas,
desinteressantes, sobre o passado.
Elas não se importam
se o ouvinte está ou não interessado; precisam falar, falar... Muitas
não despertaram para o hábito da leitura e a consequente aquisição de conhecimento. Por falta de
oportunidade, preguiça, ignorância...
A maioria das pessoas também não despertou para a prática do
silêncio. Não aprendeu a exercitar a
nobre arte de se bastar, no bom sentido, de saber se preencher, sem ser
egoísta; saber se doar desinteressadamente.
“Veja se consegue notar a intenção da fala antes que as
palavras cheguem a ser pronunciadas. Exatamente nesse momento você poderá
colocar em prática a sabedoria do discurso hábil e escolher apropriadamente se
dará voz ou não a determinado pensamento em particular. Talvez você logo
descubra que passou a apreciar períodos maiores de silêncio”, descreve Joseph
Goldstein, em “Dharma, o caminho da libertação”.
Para Goldstein, ensinamentos nos inspiram, instruem e
conduzem para aquele lugar onde podemos verdadeiramente beneficiar a todos.
DETALHES IMPRODUTIVOS
Conheço uma pessoa, muito bondosa, cuja característica é ser
detalhista a ponto de impacientar quem partilha de suas conversas. Quando a
encontro, ela costuma dizer: “Tom, você não saaaabe o que aconteceeeeu...! Pode
ser um cano furado em casa, o gatinho que ficou doente, um velho amigo que
reencontrou no Banco... É claro que chega um momento em que a pessoa está
falando sozinha. A gente acaba se distraindo ou, disfarçadamente, olha para o
relógio.
E tal pessoa traz-me um sofrimento duplo, por impaciência e
porque não gosto quando alguém a ridiculariza pelas costas. Nesse caso, creio
ser útil falar diretamente à própria pessoa, com o propósito de fazê-la ver a
importância de moderar suas descrições, pois certamente ela não tem consciência
da sua falta de objetividade. Então, de maneira educada, é preferível tentar
conscientizá-la, para que não seja eventualmente evitada ou ridicularizada.
Imagino alguém querer me evitar: que coisa mais triste!
Em um momento adequado, cheguei a abordar a situação com a
pessoa, que, felizmente, reconheceu o seu comportamento. Porém, ela não mudou.
Já se tornou um procedimento arraigado, difícil de superar. Portanto, é preciso
praticar diariamente, com toda a atenção, uma nova maneira de ser. E nada há
mais o que fazer, pois o esforço para se superar depende de cada um, para o
benefício de si mesmo e de seus tolerantes ouvintes.
CONSCIÊNCIA CRÍTICA
Em sua crônica “Ah, ser somente o presente” (Folha de S.
Paulo, 8/4/2012), Ferreira Gullar revela: “Muito embora alguns de meus poemas
falem do passado, viver no passado ou tê-lo presente no meu dia a dia não me
agrada. Na verdade, todos nós somos o que vivemos e, de certo modo, o passado
constitui também o nosso presente, quer o lembremos ou não. Mas, precisamente
porque somos o que vivemos, trazemos conosco lembranças muitas vezes dolorosas,
que de repente emergem no presente”.
Disso, crê o cronista, ninguém gosta, à exceção dos
masoquistas. Para falar com franqueza, Gullar confessa que sofrer não é a sua
vocação, embora nem sempre consiga escapar do sofrimento. “Se puder, escapo.
Creio mesmo que a vocação do ser humano é a felicidade”, diz. Mesmo
inconscientemente.
Tudo isso me lembra “O código da inteligência”, quando o
autor, o psiquiatra Augusto Cury, escreve: “O Eu representa a capacidade de
escolha e a consciência crítica. Diariamente o ‘Eu’ deve escolher sair da condição
de espectador passivo das suas mazelas e misérias para ser diretor do roteiro
da sua história. Nessa empreitada, a palavra chave é: treinamento”.
Para esse estudioso, o conformista não batalha pelo que ama
por medo da rejeição. “Não expande seu espaço por medo da crítica. Prefere ser
vítima a agente modificador da sua
história. Prefere ser amante da insegurança a parceiro do entusiasmo”.
“Livros viram opção para espantar
chatos na praia”,
Imagem: http://diariocatarinense.clicrbs.com.br |
Os mais jovens devem ficar atentos neste sentido, pois é
triste envelhecer contando e recontando histórias que só interessam a si mesmo.
Você teve um problema com a torneira da pia de sua cozinha? Viajou para algum
lugar? Engordou um pouco? Passou muito frio na noite de ontem?... É claro que
pode manifestar cada emoção, mas, por favor, sem criar uma novela. Não há quem
aguente. O ouvinte tem um limite; a partir de então, fica exausto. Olha só que
coisa desagradável a gente ser incômodo sem perceber.
Como revela Flip Flippen em “Pare de se sabotar e dê a volta
por cima”, “Vou parar de interromper as pessoas: durante um dia inteiro não vou
dizer nada em uma conversa ou reunião antes de deixar passar dois segundos de
silêncio. Essa medida vai me permitir manter o controle, observar quem teve
oportunidade de falar e perceber que talvez algumas das coisas que eu pensei
não precisavam ser ditas”.
É possível conhecer um idoso agradável, sentindo-se prazer
por estar em sua companhia. Um tipo de
pessoa que traz certa sabedoria,
alegria, estímulo..., refletindo uma espécie de ser em constante renovação. E,
para quem desconhece, os jovens apreciam bastante ficar ao seu lado. Mesmo
porque o idoso agradável também aprecia a companhia dos mais jovens. E quando o
jovem se identifica com o idoso, e vice-versa, é difícil descrever como cada
qual se beneficia nesse relacionamento.
“DESCULPE-ME, não reconheci você: eu mudei muito”
Essa frase é de Allan Percy em sua obra “Oscar Wilde para
inquietos”, que li recentemente. Segundo o autor, “Um escritor contemporâneo
afirmou que ninguém é mais diferente de outra pessoa do que é de si mesmo nos
diversos momentos da trajetória pessoal. Na maioria dos casos, isso é verdade,
pois o saudável é queimarmos etapas na vida, amadurecendo e desenvolvendo novos
interesses”.
Contudo, diz Percy, nem todo mundo evolui do mesmo modo. Não
é incomum que, anos depois de ter cumprido certa etapa da vida, uma pessoa
perceba que os amigos permanecem naquela fase e reclamam pelo fato de ela haver
mudado. De repente, pessoas que tinham muito em comum já não têm sobre o que
conversar, exceto os “velhos tempos”.
“É inútil manter uma amizade artificialmente apenas por ser
uma relação de muitos anos. Isso só rouba um tempo que poderia ser dedicado a
relacionamentos mais favoráveis ao momento que se está vivendo. E nada impede
que, no futuro, os caminhos de velhos amigos voltem a se cruzar”, conclui o
escritor.
“Tento fugir dos lugares-comuns e, muitas vezes, não consigo. A vida, em sua maior parte, é um lugar-comum.
Acabo de escrever mais um. Todos somos repetidores. Só os gênios são originais.
E eles são cada dia mais raros”, escreve Tostão, ex-futebolista, ex-médico e agora colunista,
em “A copa não é tudo” (Folha de S. Paulo, caderno Esporte, 27/5/2012).
Portanto, pensemos em Stephen Kanitz, http://blog.kanitz,com.br, mestre em
administração de empresas pela Harvard University, quando diz: “Informação é
tudo aquilo que muda o meu comportamento futuro. O resto é ruído”.
Também já citei Kanitz ao revelar que quase todos os artigos
que ele escreve têm como objetivo “mudar
o comportamento dos leitores”, porque é esta a sua definição de informação.
Para finalizar, busco inspiração em Francisco Cândido
Xavier: “Quando você não tiver uma palavra que auxilie, procure não abrir a
boca”. Pratique o silêncio e a concentração, buscando uma conexão com algo mais
elevado que possa lhe trazer tranquilidade.
***
Autor: Tom Simões, jornalista, Santos (SP),
tomsimoes@hotmail.com
Revisão do texto: Márcia Navarro Cipólli,
navarro98@gmail.com
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