sexta-feira, 21 de agosto de 2009

“O Clube do Filme”

Revendo o meu diário de vida, deparei-me com algo que escrevi no dia 22 de janeiro de 2006: “Sinto que se abriu a porta do Céu. Consciente disto, a partir de agora, são maiores minhas responsabilidades com pensamentos, atos e palavras”.

Na página seguinte do diário, deparo-me com uma citação do livro que li, na época, “Conversando com Deus”, de Neale Donald Walsch. Ele escreve: “Certa vez existiu um homem que subitamente se viu passando várias horas por semana escrevendo um livro. Todos os dias ele corria para o bloco e a caneta – às vezes no meio da noite – para registrar cada nova inspiração. Finalmente, alguém lhe perguntou o que estava fazendo. Ah!,  respondeu ele, estou colocando no papel uma longa conversa que estou tendo com Deus. Isso é ótimo!, disse o amigo. Mas ninguém sabe realmente o que Deus diria. Bem, disse o homem sorrindo, se você ao menos me deixar terminar...”


Homens, esta é a minha percepção, se interessam por literatura bem menos do que mulheres. Julgo que leem com mais frequência jornais, revistas, relatórios de trabalho... Não sabem o que perdem! Pessoas que têm o hábito da leitura sabem muito bem que o livro é um companheiro como um cão fiel. Basta tocar o cão ou abrir o livro para sentir, de imediato, o prazer dessa relação, desse companheirismo. Livros levam a descobertas inesperadas e interessantes. 


O Clube do Filme”, de autoria de David Gilmour, é uma dessas obras preciosas que ensina e educa. Conforme o comentário do “The New York Times”, David Gilmour, crítico de cinema, viveu uma fase complicada quando desempregado e com o dinheiro contado. Além disso, o filho de 15 anos colecionava reprovações em todas as disciplinas. Diante da falta de rumo daquele estudante perdido e despreparado, uma proposta paterna radical: o garoto poderia sair da escola – e ficar sem trabalhar e sem pagar aluguel – desde que assistisse com o pai, toda semana, a três filmes escolhidos pelo pai. Assim surgiu “O Clube do Filme”... É um relato sincero sobre como é difícil crescer, como é difícil ver alguém crescer e como no meio da insatisfação e da desordem de uma família não há nada tão bem-vindo quanto um filme.


Segundo a sinopse, “Este é um livro que mexe com nossas opiniões e ideias sobre vínculos familiares, bem ou mal resolvidos, ao mesmo tempo que encanta com o fascínio do cinema e o poder do afeto. David Gilmour, crítico de cinema e escritor premiado, oferece uma visão singular de filmes, roteiros, diretores e atores inesquecíveis, ao narrar, com olho clínico e irresistível sinceridade, essa extraordinária vivência. Seu relato emociona por mostrar, lado a lado, a descoberta da vida adulta pelos olhos de um jovem e os dilemas da adolescência administrados por um pai muito presente”.


Eu, particularmente, mergulhei fundo nessa “aula” de vida. Acompanhem mais sobre a sinopse da obra: “Semana a semana, pai e filho viam e discutiam o melhor (e, ocasionalmente, o pior) do cinema... Em um momento em que um pai geralmente encontra fechadas as portas para o universo interior de um filho adolescente, essas sessões os mantinham em constante diálogo – sobre mulheres, música, dor de cotovelo, trabalho, drogas, amor, amizade. E à medida que O Clube do Filme caminha para um desfecho agridoce, porém inevitável, o rapaz toma uma decisão que surpreende até o pai”. 

David Gilmour revela, com um pouco de melancolia, que educar filhos é  uma sequência de despedidas, um adeus após outro – às fraldas, aos agasalhos de neve, depois às próprias crianças. “Eles passam a vida partindo”, diz. Então, vem alguém e rebate: “Sim, mas será que eles realmente partem?”

Trechos muito felizes...

Em um trecho do livro, Gilmour comenta com Jesse, o filho: “O truque para ter uma vida feliz é ser bom em alguma coisa. Você acha que pode ser realmente bom em alguma coisa?” Ao analisar Jack Nicholson, por exemplo, Gilmour menciona a fala do próprio ator, que faz cinema há 45 anos: “Não é difícil chegar no topo. O que é difícil é permanecer lá. Ninguém consegue ter ‘sorte’ ou enganar os outros durante tanto tempo. É preciso ser bom”. 

“... Às vezes relativizamos nossas posições morais, decidimos o que é certo e errado, dependendo da nossa necessidade num determinado momento. Jesse concorda; a ideia o envolve. Dá para vê-lo pensando em acontecimentos de sua própria vida aqui e ali, buscando um paralelo”.


Com o foco num determinado filme que assiste, Jesse observa que o espectador imagina todo tipo de coisas sobre um ator que não fala. No momento em que ele abre a boca, sua importância diminui. “Seria legal ser assim na vida real. Não falar muito. Ser mais misterioso. As garotas gostam disso.”


“Garotos adolescentes precisam de tanta atenção quanto recém-nascidos. Com a diferença de que eles precisam que a atenção venha do pai”.
Impossível não se identificar com isto. 

“Mas eu estava errado, mais uma vez, como frequentemente acontece em relação a filhos. Você acha que os conhece melhor do que ninguém, depois de tantos anos perto deles, em tantos momentos tristes, felizes, preocupados. Mas não conhece. No final, eles sempre mostram alguma coisa escondida na manga, que a gente nem sequer imaginava existir”, escreve o autor. 


Surge então essa coisa dos amores da adolescência, que vêm e vão. A dor da separação. “Mas, pai, isso não significa que, se eu não tivesse terminado o namoro, ela não teria gostado tanto assim de mim? Significa, responde o pai, que o fato de você não estar mais disponível pode ter feito ela gostar mais de você do que gostaria naturalmente”. Dá para o leitor imaginar o tipo de diálogo entre pai e filho que rola nessa preciosidade de obra?


No momento final do livro, sentado na cama, David Gilmour se dá conta de que Jesse, o filho, agora já adulto, nunca mais voltaria, ao menos não da mesma forma que antes. A partir de agora, ele seria um visitante. “Não sei ao certo por que eu estava chorando – por causa dele, suponho, por ele e pela natureza fugidia e irrecuperável do tempo”, escreve. 


Também tenho um garoto de 20 anos. E, como a maioria dos pais, um desejo enorme de abraçar e beijar meu filho com frequência. E ser correspondido! Mas êta idade difícil! Todos nós passamos pela fase da adolescência. E o que mais dói, vem depois. Quando o pai já se foi..., dói o tempo da imaturidade, da oportunidade que se perdeu de estar mais próximo dele...  

É claro que há pais e pais. Saber lidar com o filho adolescente é uma arte. É preciso o pai ter muito jeito para saber se aproximar, nas oportunidades adequadas. E não se impressionar com os eventuais “descasos” do garoto. Pois, na realidade, o que deve prevalecer é que a atenção do pai é essencial para o estruturamento emocional do adolescente. 

Buscando inspiração em Osho, “Um Pássaro em Vôo”, “Nós podemos colocar a semente na terra, mas não podemos forçar a planta a sair. Nós podemos criar a condição, nós podemos proteger, nós podemos adubar a terra, nós podemos irrigar, nós podemos ver se os raios do sol a alcançam ou não, ou quanto sol é necessário, se mais ou menos. Nós podemos evitar perigos e esperar com um humor de devoção. Nós não podemos fazer nenhuma outra coisa. Só a condição pode ser criada”.


E então, que tal reproduzir com o filho a história de David Gilmour? Tem sempre uma locadora pertinho de casa com ótimas opções de filmes... Nesse último final de semana, assisti com meu filho e minha esposa “O Leitor”. Recomendo! 


Bons filmes e interessantes diálogos com o filhão! Eu ficaria muito feliz se, futuramente, algum pai ou filho me revelasse se algo mudou entre eles, a partir da leitura de “O Clube do Filme”.

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