Tenho resistido um pouco para falar do Natal. É que, nesta época do ano, incomoda-me bastante o espírito materialista que vigora em tão importante data. Perdoem-me os meus leitores, mas eu não consigo conceber uma celebração a Jesus Cristo de forma tão comercializada. Pela lógica, e para quem é sensato, esta seria uma data para reverenciar o Cristo de uma forma espiritualizada, sem nenhum tipo de manifestação material.
Contardo Calligaris, em sua crônica “Presentes de Natal” (Folha de S.Paulo, Ilustrada, 3 de dezembro de 2009), é que ora me inspira. Diz o cronista: “Não quero criticar o costume de oferecer presentes e os ‘excessos’ das festas. A questão que me interessa é outra: toda consideração moral à parte, será que os gastos natalinos são um bom negócio para a economia? Ou seja, gastando para presentes e ceias, estamos mesmo criando e distribuindo riqueza?
De qualquer forma, escreve Contardo, o Brasil já está entre os campeões mundiais em extravagância perdulária natalina. “Claro, há muitos países ricos que, no Natal, gastam mais do que a gente, mas o que vale, nessa classificação, não são os valores absolutos, mas as vendas do varejo no mês de dezembro comparadas com as dos meses contíguos. Ora, em dezembro, no Brasil, a gente gasta por volta de 40 % a mais do que na média de novembro e janeiro”.
Trocas mais produtivas
Contardo Calligaris cita Joel Waldfogel, professor da Wharton (a famosa escola de administração da Universidade da Pensilvânia), que acaba de publicar um pequeno livro, seriíssimo e divertido, “Scroogenomics – Why You Shouldn’t Buy Presents for the Holidays” (Scroogeconomia – por que você não deve comprar presentes para as festas). “O livro defende a seguinte tese: o Natal é uma calamidade econômica, durante a qual nossas sociedades, a cada ano, destroem riquezas consideráveis”.
Contardo revela ainda: “Quer a gente goste ou não da tradição natalina de trocar presentes, seria bom, comenta Waldfogel, que conseguíssemos, ao menos, tornar essa troca mais produtiva. Obviamente, Waldfogel aprova o uso do vale-presente [...] e nos encoraja a oferecer dinheiro, sem constrangimento”.
Quando observo as lojas lotadas de pessoas adquirindo objetos em excesso... Quando penso nas extravagantes ceias de Natal...
Quando penso nas sobras de comida..., imagino como Jesus ficaria mais feliz se algumas pessoas substituíssem essa extravagância por uma comida simples, preparada especialmente para alguns moradores de rua!... Imagino como Ele ficaria mais feliz se os presentes fossem substituídos por palavras, gestos, cartas manuscritas, e-mails, livros, abraços e beijos..., tão somente!... Imagino os templos abertos, de todas as religiões, para as famílias se concentrarem para conceber, ali sim, à meia-noite do dia 24 de dezembro, o espírito natalino.
É claro que eu não eliminaria a ceia de Natal. Porém, com outro propósito, a começar pela simplicidade da comida e, sobretudo, com bebida moderada. O espírito do Natal não combina com o espírito do consumismo.
Às vezes, ao dar um presente pode-se estar estimulando o egoísmo do outro, que fica avidamente no aguardo do presente. Por outro lado, aquele que presenteia pode estar buscando compensar possíveis lacunas de relacionamento, revela o amigo Roberto da Graça Lopes.
É muito importante nesta época pensar em simplicidade e propósito. “Que o propósito seja espiritualizado e que, na verdade, o Cristo aproxime as pessoas e não aprofunde as diferenças entre aqueles que o Papai Noel chega com um caminhão e, para outros, nem mesmo, com um carrinho de feira”, comenta o amigo.
Opção pelo essencial
Em sua crônica de 8 de dezembro de 2009, na Folha de S.Paulo, Cotidiano, Rubem Alves cita o livro sagrado do taoísmo, o “Tao-Te-Ching”. Segundo a obra, estamos constantemente divididos: de um lado, a tentação de 10 mil coisas que demandam ação. Todas não essenciais. Do outro lado está uma única coisa: o essencial, raiz das 10 mil perturbações. Sabedoria, escreve o cronista, é deixar o sufoco das 10 mil coisas não essenciais e focalizar os olhos na única coisa que é essencial. “Tudo o mais é acessório”.
Conforme descreve Anselm Grün, monge beneditino alemão, em sua obra “Transforme seu medo”, “Jesus, assim se expressa o Evangelho de João, venceu o mundo. Não se deixou determinar pelos padrões deste mundo. Na fé, vemos o mundo com outros olhos. Ali olhamos para o fundamento, para a essência das coisas. E em tudo vemos, em última análise, Deus. Por isso estamos no mundo, mas não somos dominados por ele. Na fé, vemos que o próprio Deus veio a este mundo através de Jesus Cristo”.
É claro que não desejo aqui desprestigiar a festa de Natal. Fomos criados concebendo esta data para dar presentes e comprar objetos pessoais. E eu tenho esperança que, ao longo dos anos, isso possa mudar. Calligaris e Waldfogel também, indiretamente, nos levam a refletir sobre isso.
Quem sabe, as próximas gerações, lá bem na frente..., passem a celebrar o aniversário de Cristo de forma mais sadia, sem os tradicionais excessos, mas com muita emissão de luz interior. Nada de trocas materiais, por conta de compromissos evitáveis. Falo das coisas essenciais, que o homem não adquire com dinheiro.
Então, é preciso prestar atenção no essencial e evitar o exagero que muitas vezes cometemos em relação às nossas escolhas pessoais.
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