Ao nos surpreendermos com um fato dessa natureza, primeiro vem o espanto. Ao folhear o jornal Folha de S.Paulo neste sábado, 25 de abril, logo cedo, deparar-me com a manchete “História Trágica” e imaginar o drama dessa mãe, meus olhos umedeceram. Ao longo do dia emocionei-me por mais duas vezes ao pensar na sua dor incontida.
Flávia Costa Hahn, 60, consultora gaúcha aposentada, matou o único filho, de 24 anos, dependente de crack, durante uma briga na Páscoa. Flávia, que responde ao processo em liberdade, revela que o tiro foi acidental, no momento em que o marido, que é colecionador, tentava tomar o revólver, conforme escreve Graciliano Rocha no artigo da Folha. Ela pegou a arma após ser empurrada pelo filho sobre vidros quebrados e sofrer agressões.
Sem me preocupar com quaisquer julgamentos, quase sempre precipitados e injustos, pensei na sua angústia, imaginando que desfecho fatal seria esse e que certamente ela estaria muito desnorteada.
Durante a entrevista a Graciliano, Flávia conta que o filho, Tobias Lee Manfred Hahn, a submetia a constantes ameaças e chantagens. O disparo ocorreu durante uma briga por mais dinheiro, na residência, localizada em um bairro de classe média alta de Porto Alegre (RS).
Com a alma dilacerada
“Sento aqui e penso que ele está ali (aponta para o jardim). É uma ausência, um vazio infinito. Não vou ficar nesta casa. Vou alugar ou vender”, diz ao jornalista. Só tomando calmantes, ela consegue dormir.
Sem saber de detalhes da vida do jovem, como o leitor estaria julgando até agora o involuntário “crime” dessa mãe? Sim, pois as pessoas tendem a dar o seu implacável veredicto sobre fatos do cotidiano sem a menor complacência. Raros são aqueles que evitam julgamentos precipitados e conseguem silenciar. E até se colocar no lugar do outro. São pessoas que não costumam julgar friamente o desatino de outrem, por estarem conscientes que há sempre uma longa história a ser compreendida e que antecede o resultado: cada um de nós como seres humanos.
Então, cada vez que lembro da dor dessa mãe, esforço-me para conter a emoção. A morte do jovem é um fato consumado. A tristeza da mãe, algo que merece o nosso profundo respeito. Ninguém tem o direito de julgá-la. A Justiça, que existe para isso, deu-lhe o direito de responder ao processo em liberdade. Mesmo porque, de que serve julgar se não fazemos parte do júri?
O vício
Segundo Flávia conta a Graciliano, seu filho começou a fumar maconha aos 14 anos. Com 17, com uma namorada, experimentou a cocaína e daí foi para o crack.
Após sumir com vários objetos de casa, Tobias Lee chegou a cometer pequenos assaltos, que deixaram de ocorrer quando a mãe passou a lhe dar dinheiro. Ocorre que, com o tempo, ele exigia que o dinheiro fosse diário, ameaçando incendiar a casa, quebrar vidros, chegando a jogar pedras. O jovem foi internado seis vezes, por períodos de 30 dias.
O trágico dia
Entre o sábado e aquela madrugada, conta Graciliano, a mãe já havia dado R$ 100. Às duas horas, deu mais R$ 20. Às três horas, Tobias pediu que ela o acompanhasse até um posto para comprar cigarro e cerveja. Então pediu para a mãe sacar mais R$ 20 no caixa eletrônico.
Flávia estava feliz naquele momento, pela proximidade dos dois, coisa que não era comum. O jovem estava sem comer e lhe pediu uma pizza. Voltaram conversando.
“Perto de casa, ele tomou outro caminho, foi comprar mais droga, já estava três dias sem dormir. Só apareceu em casa à tarde. Ele ficou me ameaçando. Só posso dizer que foi um acidente. Eu não apontei a arma para o meu filho. Ele estava correndo, foi um acidente quando meu marido tirava a arma da minha mão.”
Em busca de um “alento”...
Flávia, como mãe de dependente, deseja agora, com sua experiência, dedicar-se a auxiliar famílias de usuários. Segundo informa ao jornalista da Folha, viciados têm entre 14 e 25 anos, e os pais não têm informação adequada. Ela diz que, mesmo instruída, demorou muito para aprender a lidar com o filho.
O seu grande desejo agora é apoiar mães de drogados, para que não desistam de lutar. “Que se, entre mil, um se salvar talvez seja o filho de uma delas. Eu não consegui salvar o meu”, diz.
Em seu desespero, lutar por uma causa dessa natureza talvez possa aliviar o sofrimento dessa mãe. Na realidade, a angústia de Flávia em nada contribuirá para um mundo melhor. Seu sofrimento tem mesmo de ser convertido num poder de mudança, de desafio para tentar conseguir salvar jovens dependentes, como se tivesse salvando seu filho.
Quer creia ou não, meu leitor, que respeito profundamente, prefiro continuar acreditando que a morte não é o fim de tudo. Ela pode significar o término de uma etapa da Grande Vida e, para quem está de luto, a oportunidade para se transformar positivamente.
Durmo melhor pensando que, conduzindo melhor nossa vida, despertando para ações elevadas em nome de quem morreu, refletimos luz para a sua alma, assim como acontece durante a missa de sétimo dia.
Passada a fase inicial, de superação da separação física, é preciso direcionar outro olhar para aquele que se foi. A percepção de sua alma iluminada através de mudanças elevadas e reais que possamos exercitar neste mundo em seu nome.
Se Flávia puder me ler, saiba ela que a acolho verdadeiramente e que o melhor que pode fazer pelo filho é mesmo buscar algo elevado para preencher o seu imenso vazio, como essa nobre causa que deseja acolher que, certamente, iluminará o espírito do jovem Tobias, onde quer que esteja.
Dramas como esse vivido por Flávia Hahn não devem significar apenas fatos sensacionais que levem o leitor à emoção. Eles devem servir como instrumentos de reflexão, a partir de uma abordagem útil, como ensinamento à sociedade. São agentes emocionais para trazer sabedoria, onde sempre há um misto de razão e sensibilidade. Isto me conduz a Rubem Alves: “Os conhecimentos nos dão meios para viver. A sabedoria nos dá razões para viver” ... eu diria ... para viver melhor, e a Albert Einstein: “A mente que se abre a uma nova idéia jamais volta ao seu tamanho original” ... parafraseando eu diria: Mente e coração que se abrem após uma experiência traumática jamais deixarão o mundo em seu “tamanho original”.
Flávia Costa Hahn, 60, consultora gaúcha aposentada, matou o único filho, de 24 anos, dependente de crack, durante uma briga na Páscoa. Flávia, que responde ao processo em liberdade, revela que o tiro foi acidental, no momento em que o marido, que é colecionador, tentava tomar o revólver, conforme escreve Graciliano Rocha no artigo da Folha. Ela pegou a arma após ser empurrada pelo filho sobre vidros quebrados e sofrer agressões.
Sem me preocupar com quaisquer julgamentos, quase sempre precipitados e injustos, pensei na sua angústia, imaginando que desfecho fatal seria esse e que certamente ela estaria muito desnorteada.
Durante a entrevista a Graciliano, Flávia conta que o filho, Tobias Lee Manfred Hahn, a submetia a constantes ameaças e chantagens. O disparo ocorreu durante uma briga por mais dinheiro, na residência, localizada em um bairro de classe média alta de Porto Alegre (RS).
Com a alma dilacerada
“Sento aqui e penso que ele está ali (aponta para o jardim). É uma ausência, um vazio infinito. Não vou ficar nesta casa. Vou alugar ou vender”, diz ao jornalista. Só tomando calmantes, ela consegue dormir.
Sem saber de detalhes da vida do jovem, como o leitor estaria julgando até agora o involuntário “crime” dessa mãe? Sim, pois as pessoas tendem a dar o seu implacável veredicto sobre fatos do cotidiano sem a menor complacência. Raros são aqueles que evitam julgamentos precipitados e conseguem silenciar. E até se colocar no lugar do outro. São pessoas que não costumam julgar friamente o desatino de outrem, por estarem conscientes que há sempre uma longa história a ser compreendida e que antecede o resultado: cada um de nós como seres humanos.
Então, cada vez que lembro da dor dessa mãe, esforço-me para conter a emoção. A morte do jovem é um fato consumado. A tristeza da mãe, algo que merece o nosso profundo respeito. Ninguém tem o direito de julgá-la. A Justiça, que existe para isso, deu-lhe o direito de responder ao processo em liberdade. Mesmo porque, de que serve julgar se não fazemos parte do júri?
O vício
Segundo Flávia conta a Graciliano, seu filho começou a fumar maconha aos 14 anos. Com 17, com uma namorada, experimentou a cocaína e daí foi para o crack.
Após sumir com vários objetos de casa, Tobias Lee chegou a cometer pequenos assaltos, que deixaram de ocorrer quando a mãe passou a lhe dar dinheiro. Ocorre que, com o tempo, ele exigia que o dinheiro fosse diário, ameaçando incendiar a casa, quebrar vidros, chegando a jogar pedras. O jovem foi internado seis vezes, por períodos de 30 dias.
O trágico dia
Entre o sábado e aquela madrugada, conta Graciliano, a mãe já havia dado R$ 100. Às duas horas, deu mais R$ 20. Às três horas, Tobias pediu que ela o acompanhasse até um posto para comprar cigarro e cerveja. Então pediu para a mãe sacar mais R$ 20 no caixa eletrônico.
Flávia estava feliz naquele momento, pela proximidade dos dois, coisa que não era comum. O jovem estava sem comer e lhe pediu uma pizza. Voltaram conversando.
“Perto de casa, ele tomou outro caminho, foi comprar mais droga, já estava três dias sem dormir. Só apareceu em casa à tarde. Ele ficou me ameaçando. Só posso dizer que foi um acidente. Eu não apontei a arma para o meu filho. Ele estava correndo, foi um acidente quando meu marido tirava a arma da minha mão.”
Em busca de um “alento”...
Flávia, como mãe de dependente, deseja agora, com sua experiência, dedicar-se a auxiliar famílias de usuários. Segundo informa ao jornalista da Folha, viciados têm entre 14 e 25 anos, e os pais não têm informação adequada. Ela diz que, mesmo instruída, demorou muito para aprender a lidar com o filho.
O seu grande desejo agora é apoiar mães de drogados, para que não desistam de lutar. “Que se, entre mil, um se salvar talvez seja o filho de uma delas. Eu não consegui salvar o meu”, diz.
Em seu desespero, lutar por uma causa dessa natureza talvez possa aliviar o sofrimento dessa mãe. Na realidade, a angústia de Flávia em nada contribuirá para um mundo melhor. Seu sofrimento tem mesmo de ser convertido num poder de mudança, de desafio para tentar conseguir salvar jovens dependentes, como se tivesse salvando seu filho.
Quer creia ou não, meu leitor, que respeito profundamente, prefiro continuar acreditando que a morte não é o fim de tudo. Ela pode significar o término de uma etapa da Grande Vida e, para quem está de luto, a oportunidade para se transformar positivamente.
Durmo melhor pensando que, conduzindo melhor nossa vida, despertando para ações elevadas em nome de quem morreu, refletimos luz para a sua alma, assim como acontece durante a missa de sétimo dia.
Passada a fase inicial, de superação da separação física, é preciso direcionar outro olhar para aquele que se foi. A percepção de sua alma iluminada através de mudanças elevadas e reais que possamos exercitar neste mundo em seu nome.
Se Flávia puder me ler, saiba ela que a acolho verdadeiramente e que o melhor que pode fazer pelo filho é mesmo buscar algo elevado para preencher o seu imenso vazio, como essa nobre causa que deseja acolher que, certamente, iluminará o espírito do jovem Tobias, onde quer que esteja.
Dramas como esse vivido por Flávia Hahn não devem significar apenas fatos sensacionais que levem o leitor à emoção. Eles devem servir como instrumentos de reflexão, a partir de uma abordagem útil, como ensinamento à sociedade. São agentes emocionais para trazer sabedoria, onde sempre há um misto de razão e sensibilidade. Isto me conduz a Rubem Alves: “Os conhecimentos nos dão meios para viver. A sabedoria nos dá razões para viver” ... eu diria ... para viver melhor, e a Albert Einstein: “A mente que se abre a uma nova idéia jamais volta ao seu tamanho original” ... parafraseando eu diria: Mente e coração que se abrem após uma experiência traumática jamais deixarão o mundo em seu “tamanho original”.
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