Imagem: gaturamo-bandeira, www.clubedocriador.com |
POLÍTICA. Eis um termo delicado para se comentar, sobretudo quando se trata de análises sensatas, que não impliquem influenciar eleitores para determinado partido ou candidato.
Como uma das funções deste blog é divulgar, comentar, assuntos selecionados de veículos de comunicação, que possam enriquecer o leitor, escolhi três interessantes referências recentes que tratam de política sob um aspecto mais amplo.
O artigo “Política e assassinato” é a primeira referência. Escrito por Rubem Alves, o texto foi publicado na Folha de S. Paulo, Cotidiano, de 19 de outubro de 2010.
Observando o que tem acontecido na política brasileira, escreve Rubem Alves, “... Meus olhos veem três tipos de atores desfilando à minha frente: os políticos por profissão, os palhaços e os poetas. Cada um deles jogando do jeito como sabem e gostam de jogar.”
Como uma das funções deste blog é divulgar, comentar, assuntos selecionados de veículos de comunicação, que possam enriquecer o leitor, escolhi três interessantes referências recentes que tratam de política sob um aspecto mais amplo.
O artigo “Política e assassinato” é a primeira referência. Escrito por Rubem Alves, o texto foi publicado na Folha de S. Paulo, Cotidiano, de 19 de outubro de 2010.
Observando o que tem acontecido na política brasileira, escreve Rubem Alves, “... Meus olhos veem três tipos de atores desfilando à minha frente: os políticos por profissão, os palhaços e os poetas. Cada um deles jogando do jeito como sabem e gostam de jogar.”
Comenta o cronista: “Os políticos por profissão fazem o jogo do poder. Como jogadores de tênis, é preciso dar a cortada que tire o outro concorrente da jogada. Cada cortada bem sucedida é um golpe assassino. Promessas são engodos para que o peixe morda o anzol. Todos os anzóis são permitidos.” Ele cita estas palavras de Maquiavel: “Não importa que o Príncipe seja justo; o que importa é que ele ‘pareça’ justo.” Rubem admite: os peixes não são movidos pelo anzol, mas por aquilo que ‘parece ser’ a isca. “Daí a importância dos especialistas na produção de imagens. São eles que seduzem os peixes a morder a isca”.
Mas veja só a imaginação de Rubem: “O Tiririca não queria enganar ninguém. O cinismo do candidato era descaradamente verdadeiro. Ele queria apenas representar o seu número de palhaço. Mas se enganam aqueles que interpretam a sua performance no pleito como uma ‘palhaçada’. O voto para o Tiririca foi uma palavra, na verdade um ‘palavrão’ do eleitor, uma gargalhada no picadeiro do circo das eleições...” Traduzindo seu significado, observa o cronista, o voto ao Tiririca queria dizer: “Eu o considero palhaço, superior a todos os outros que se vestem com jaquetão e gravata...”
“E a Marina... Fraca. Por que se candidatou? Candidatou-se para dizer um poema, sabendo que ‘a política nunca pode provocar poesia’ (Goethe). E com a poesia proclamou aquilo que Camus anunciou: que nenhum povo pode viver sem a beleza.”
Camus percebeu o impulso assassino da política e declarou que nunca poderia ser um político por ser incapaz de desejar a morte de seus adversários, comenta Rubem. “Os debates políticos, não são eles todos tentativas de assassinato?”
E, para finalizar, nos brinda o grande escritor brasileiro: “Mas depois de apurados os assassinatos, onde estará a poesia? De que se alimentará o povo?”
PERDAS E GANHOS
A segunda referência, que reproduzo na íntegra, é esta interessante análise de Marcelo Neri, 47, mcneri@fgv.br, publicada na Folha de S. Paulo, Mercado, no dia 24 de outubro de 2010, sob o título: “Memórias, sonhos e eleições”. Marcelo é economista-chefe do Centro de Políticas Sociais e professor da EPGE, na Fundação Getulio Vargas, www.fgv.br/cps:
Mas veja só a imaginação de Rubem: “O Tiririca não queria enganar ninguém. O cinismo do candidato era descaradamente verdadeiro. Ele queria apenas representar o seu número de palhaço. Mas se enganam aqueles que interpretam a sua performance no pleito como uma ‘palhaçada’. O voto para o Tiririca foi uma palavra, na verdade um ‘palavrão’ do eleitor, uma gargalhada no picadeiro do circo das eleições...” Traduzindo seu significado, observa o cronista, o voto ao Tiririca queria dizer: “Eu o considero palhaço, superior a todos os outros que se vestem com jaquetão e gravata...”
“E a Marina... Fraca. Por que se candidatou? Candidatou-se para dizer um poema, sabendo que ‘a política nunca pode provocar poesia’ (Goethe). E com a poesia proclamou aquilo que Camus anunciou: que nenhum povo pode viver sem a beleza.”
Camus percebeu o impulso assassino da política e declarou que nunca poderia ser um político por ser incapaz de desejar a morte de seus adversários, comenta Rubem. “Os debates políticos, não são eles todos tentativas de assassinato?”
E, para finalizar, nos brinda o grande escritor brasileiro: “Mas depois de apurados os assassinatos, onde estará a poesia? De que se alimentará o povo?”
PERDAS E GANHOS
A segunda referência, que reproduzo na íntegra, é esta interessante análise de Marcelo Neri, 47, mcneri@fgv.br, publicada na Folha de S. Paulo, Mercado, no dia 24 de outubro de 2010, sob o título: “Memórias, sonhos e eleições”. Marcelo é economista-chefe do Centro de Políticas Sociais e professor da EPGE, na Fundação Getulio Vargas, www.fgv.br/cps:
“OS BRASILEIROS não se conformam com as votações na internet que colocam Maradona à frente de Pelé como o melhor jogador de futebol de todos os tempos. Pleitos são decididos pela experiência prática de cada um: a geração mais nova não viu o agora setentão rei Pelé jogar, mas vibrou ao vivo e em cores com os gols do craque argentino.
A mesma lógica vale para as influências eleitorais hoje da memorável estabilização econômica de Fernando Henrique Cardoso.
O Brasil foi o país com maior inflação no mundo entre 1970 e 1995. Foi tanta inflação que hoje, mesmo após 16 anos de estabilidade, é o segundo em inflação acumulada desde 1970, perdendo apenas para a República do Congo e goleando a Argentina, nossa rival, neste campo.
O fato é que o jovem brasileiro de hoje não tem na memória o pesadelo inflacionário pregresso e também não o vê como ameaça futura.
Similarmente, o crescimento de renda recente foi vivido por muitos, mas não por todos. De 2001 a 2009, a renda per capita dos 10% mais ricos aumentou 1,5% ao ano, contra 6,8% dos 10% mais pobres.
O número de pobres caiu 20,5 milhões desde o fim da recessão de 2003. A popularidade da candidata da situação é incompreendida pela elite econômica que não experimentou os saborosos frutos da expansão brasileira dos últimos anos.
Vale lembrar a continuidade do crescimento inclusivo no Brasil durante a crise. Nos 12 últimos meses, houve aceleração dessa tendência, mesmo comparada ao período de ouro, embora ganhando impulso nas eleições. Eleições são quando se pereniza o transitório.
A desigualdade segue agora queda ainda mais forte que no período conhecido como da queda da desigualdade (www.fgv.br/cps/ncm). Mais do que o ‘É a economia, estúpido!’ da eleição dos EUA de 1992, talvez o mais adequado para representar o caso brasileiro de 2010 seja: ‘É o social, companheiro!’.
Olhando mais para cima na distribuição de renda, 29 milhões de pessoas -mais de meia população francesa- foram incorporadas à nova classe média (classe C) entre 2003 e 2009, pessoas que antes eram consideradas pobres.
Os agora 95 milhões em ação na nova classe média correspondem a 50,5% da população brasileira -ela inclui não só o eleitor mediano que decide eleições, mas poderia sozinha decidir um pleito eleitoral.
Corações, mentes e acima de tudo os sonhos desse grupo emergente de um país emergente são a fronteira a ser conquistada pelos presidenciáveis. Eleição diz respeito ao futuro, a sonhos que pareçam possíveis.
A popularidade de Lula é tal que ele não é considerado um novo Getúlio, mas Getúlio é visto como o velho Lula. Getúlio era o pai dos pobres; já Lula não é o pai dos pobres, nem mesmo pai desta nova classe média -ele é a nova classe média. Ele, melhor do que ninguém, encarna a possibilidade de ascensão social de cada brasileiro.
Ao povo brasileiro a oportunidade de educação de qualidade não foi dada. Quando a elite brasileira vê Lula falar, critica o seu português; já o povo pensa: "Ele fala que nem eu". Se ele pode: "Sim, nós também podemos!". Lula desperta os mais pobres para o sonho brasileiro, que é similar ao americano, e de outros povos, que é subir na vida. Em época eleitoral, sonhos valem mais do que memórias.
A popularidade de Lula não foi suficiente para eleger a sua candidata no primeiro turno da eleição. O povo brasileiro hoje não quer um pai. O brasileiro também não quer um presidente que fale de memórias passadas, e menos ainda que "o sonho acabou". Ele quer um, ou uma, líder que o ajude no seu "pode mais", na grande transformação de seus sonhos em realidade.
Independentemente dos resultados desta eleição que se descortina, teremos nos futuros livros de história, ao revisitarem a primeira virada de milênio do Novo Mundo, generosas citações a Fernando Henrique Cardoso e Lula. Novas moedas serão cunhadas com suas respectivas efígies e serão usadas por intervalos de tempo mais longos do que a memória das pessoas.”
PORNOPOLÍTICA
Na terceira referência inspiro-me no artigo “Pornopolítica”, de autoria de Carlos Alberto Di Franco, doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, publicado no jornal “O Estado de S. Paulo”, Espaço Aberto, de 14 de dezembro de 2009.
Conta Di Franco: “A História mundial está repleta de exemplos inspiradores. E a saga brasileira, também. Os defeitos pessoais e as limitações humanas dos homens públicos, inevitáveis e recorrentes como as chuvas de verão, não matavam a política. Hoje, no entanto, assistimos ao advento da pornopolítica. A vida pública, com raras e contadas exceções, transformou-se num espaço mafioso, numa avenida transitada por governantes corruptos, políticos cínicos e gangues especializadas no assalto ao dinheiro público.”
Para esse articulista, a imprensa, sem as mordaças que alguns defendem e livre de quaisquer tentativas de cooptação, tem um papel decisivo no processo de recuperação da ética. “DENUNCIAR A CORRUPÇÃO É UM DEVER. MAS, AO MESMO TEMPO, DEVEMOS CONSTRUIR UMA AGENDA POSITIVA E APOIAR AÇÕES AFIRMATIVAS NO CAMPO DA ÉTICA NA POLÍTICA.”
Isto é algo em que costumo pensar. Que os veículos da mídia possam ocupar seus espaços destacando mais ações humanas e sociais produtivas, num sentido mais amplo. Ao ler diariamente o jornal, por exemplo, é raro encontrar fatos que sensibilizam o leitor no aspecto da construção de um mundo melhor.
Acusações políticas e ocorrências policiais predominam no enfoque jornalístico, um “bom assunto” para sustentar conversas, na maior parte das vezes infrutíferas, de bar em bar.
A mesma lógica vale para as influências eleitorais hoje da memorável estabilização econômica de Fernando Henrique Cardoso.
O Brasil foi o país com maior inflação no mundo entre 1970 e 1995. Foi tanta inflação que hoje, mesmo após 16 anos de estabilidade, é o segundo em inflação acumulada desde 1970, perdendo apenas para a República do Congo e goleando a Argentina, nossa rival, neste campo.
O fato é que o jovem brasileiro de hoje não tem na memória o pesadelo inflacionário pregresso e também não o vê como ameaça futura.
Similarmente, o crescimento de renda recente foi vivido por muitos, mas não por todos. De 2001 a 2009, a renda per capita dos 10% mais ricos aumentou 1,5% ao ano, contra 6,8% dos 10% mais pobres.
O número de pobres caiu 20,5 milhões desde o fim da recessão de 2003. A popularidade da candidata da situação é incompreendida pela elite econômica que não experimentou os saborosos frutos da expansão brasileira dos últimos anos.
Vale lembrar a continuidade do crescimento inclusivo no Brasil durante a crise. Nos 12 últimos meses, houve aceleração dessa tendência, mesmo comparada ao período de ouro, embora ganhando impulso nas eleições. Eleições são quando se pereniza o transitório.
A desigualdade segue agora queda ainda mais forte que no período conhecido como da queda da desigualdade (www.fgv.br/cps/ncm). Mais do que o ‘É a economia, estúpido!’ da eleição dos EUA de 1992, talvez o mais adequado para representar o caso brasileiro de 2010 seja: ‘É o social, companheiro!’.
Olhando mais para cima na distribuição de renda, 29 milhões de pessoas -mais de meia população francesa- foram incorporadas à nova classe média (classe C) entre 2003 e 2009, pessoas que antes eram consideradas pobres.
Os agora 95 milhões em ação na nova classe média correspondem a 50,5% da população brasileira -ela inclui não só o eleitor mediano que decide eleições, mas poderia sozinha decidir um pleito eleitoral.
Corações, mentes e acima de tudo os sonhos desse grupo emergente de um país emergente são a fronteira a ser conquistada pelos presidenciáveis. Eleição diz respeito ao futuro, a sonhos que pareçam possíveis.
A popularidade de Lula é tal que ele não é considerado um novo Getúlio, mas Getúlio é visto como o velho Lula. Getúlio era o pai dos pobres; já Lula não é o pai dos pobres, nem mesmo pai desta nova classe média -ele é a nova classe média. Ele, melhor do que ninguém, encarna a possibilidade de ascensão social de cada brasileiro.
Ao povo brasileiro a oportunidade de educação de qualidade não foi dada. Quando a elite brasileira vê Lula falar, critica o seu português; já o povo pensa: "Ele fala que nem eu". Se ele pode: "Sim, nós também podemos!". Lula desperta os mais pobres para o sonho brasileiro, que é similar ao americano, e de outros povos, que é subir na vida. Em época eleitoral, sonhos valem mais do que memórias.
A popularidade de Lula não foi suficiente para eleger a sua candidata no primeiro turno da eleição. O povo brasileiro hoje não quer um pai. O brasileiro também não quer um presidente que fale de memórias passadas, e menos ainda que "o sonho acabou". Ele quer um, ou uma, líder que o ajude no seu "pode mais", na grande transformação de seus sonhos em realidade.
Independentemente dos resultados desta eleição que se descortina, teremos nos futuros livros de história, ao revisitarem a primeira virada de milênio do Novo Mundo, generosas citações a Fernando Henrique Cardoso e Lula. Novas moedas serão cunhadas com suas respectivas efígies e serão usadas por intervalos de tempo mais longos do que a memória das pessoas.”
PORNOPOLÍTICA
Na terceira referência inspiro-me no artigo “Pornopolítica”, de autoria de Carlos Alberto Di Franco, doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, publicado no jornal “O Estado de S. Paulo”, Espaço Aberto, de 14 de dezembro de 2009.
Conta Di Franco: “A História mundial está repleta de exemplos inspiradores. E a saga brasileira, também. Os defeitos pessoais e as limitações humanas dos homens públicos, inevitáveis e recorrentes como as chuvas de verão, não matavam a política. Hoje, no entanto, assistimos ao advento da pornopolítica. A vida pública, com raras e contadas exceções, transformou-se num espaço mafioso, numa avenida transitada por governantes corruptos, políticos cínicos e gangues especializadas no assalto ao dinheiro público.”
Para esse articulista, a imprensa, sem as mordaças que alguns defendem e livre de quaisquer tentativas de cooptação, tem um papel decisivo no processo de recuperação da ética. “DENUNCIAR A CORRUPÇÃO É UM DEVER. MAS, AO MESMO TEMPO, DEVEMOS CONSTRUIR UMA AGENDA POSITIVA E APOIAR AÇÕES AFIRMATIVAS NO CAMPO DA ÉTICA NA POLÍTICA.”
Isto é algo em que costumo pensar. Que os veículos da mídia possam ocupar seus espaços destacando mais ações humanas e sociais produtivas, num sentido mais amplo. Ao ler diariamente o jornal, por exemplo, é raro encontrar fatos que sensibilizam o leitor no aspecto da construção de um mundo melhor.
Acusações políticas e ocorrências policiais predominam no enfoque jornalístico, um “bom assunto” para sustentar conversas, na maior parte das vezes infrutíferas, de bar em bar.
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Revisão de Texto: Márcia Navarro Cipólli, navarro98@gmail.com
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