quinta-feira, 10 de julho de 2008

Igreja perde oportunidade de transformar indivíduos na essência

Permitam-me uma leitura cuidadosa em relação ao comportamento de alguns padres no ato da celebração da missa. Na pré-adolescência vivi intensamente a Igreja Católica, auxiliando um pároco que me trouxe até chocolate da Espanha, quando viajou àquele país para visitar a família. Também estudei em
escola de carmelitas. Por isto, posso dizer que me afastei do catolicismo por não obter respostas adequadas a questionamentos existenciais.

Aprecio a igreja como templo sagrado, principalmente quando está deserta. Reina ali uma paz indescritível, que inspira a elevação no plano espiritual. Mas ao presenciar uma missa, por exemplo, não raramente lamento o sermão do padre, regido pelo medo, castigo e tentações, colocando Deus distante do homem. A religião é o ato de religar o ser humano ao Divino. Independente do tipo de seita, ela deve servir como instrumento de transformação racional dos fiéis.

O sermão é um oportuno instrumento de conscientização, destinado à reflexão interior, que pode verdadeiramente provocar mudanças essenciais na vida das pessoas, acredito. As missas atraem, semanalmente, dezenas de indivíduos que ali se dirigem para a remissão dos pecados e salvar a alma. Conscientes de erros, eles buscam a orientação espiritual para corrigir imperfeições e viver mais em paz.

Mas alguém dirá que há padres que fazem diferença. E eu seria injusto se não admitisse. O teólogo, filósofo e bispo Dom Luciano Mendes de Almeida, que faleceu no final de agosto de 2006, era um exemplo. Na oportunidade de seu falecimento, Dom Pedro Luiz Stringhini, bispo auxiliar de São Paulo, registrou emocionante mensagem na Folha de S.Paulo de 30/8: ... "A igreja e o mundo precisam de pessoas capazes, lúcidas, generosas. Soluções só virão com grandeza de espírito, em que causas nobres e urgentes sejam colocadas acima dos interesses individuais e pequenos. Dom Luciano mostrou que pessoas assim existem, marcam, fazem diferença, semeiam esperança, acreditam no ser humano. Sofria ao pensar que a sociedade atual, avançada tecnologicamente, não só permite como se mantém indiferente ao drama dos que passam fome..."

Como estudante, neo-sacerdote e professor, em Roma, Dom Luciano iniciou seu apostolado junto aos presos. Com sua lucidez, profetismo, testemunho eloqüente de caridade, bondade e santidade, resumia-se simplesmente como uma pessoa feliz, escreveu Dom Pedro Stringhini.

Fé raciocinada

O jornalista Valdo Cruz, 46, repórter especial da Folha, em artigo de 6/5/2007, disse fazer parte do grupo estatístico de ex-católicos que migraram para outra religião, em seu caso, o espiritualismo. Valdo trilhou esse caminho, depois de ser católico praticante até os 20 e poucos anos, na busca de respostas para inúmeros questionamentos. Ele queria entender, por exemplo, por que alguns nascem com deficiências físicas, outros, em regiões paupérrimas. Não conseguia admitir a explicação "Deus quis assim".

No espiritualismo, o jornalista encontrou uma fé raciocinada. Descobriu que somos hoje o resultado de muitas vidas passadas, sujeitos à lei da ação e reação. "Não temos um papa, como a Igreja Católica, mas seguimos o mesmo guia de vida: os ensinamentos de Jesus. Aprendemos que uma fé sem obras não se sustenta. Daí que praticar a caridade é uma lei – a ser seguida com prazer na comunidade carente, no trabalho, na família", admitiu.

Roselis von Sass, em "A verdade sobre os incas", complementa: "Não sabemos quais as vidas que já vivemos, porém podemos determinar a espécie de nossas futuras vidas. Agora, hoje, a cada hora ... pois nosso futuro depende de nossa vida atual." Em "O segredo", Rhonda Byrne arremata: "Você nasceu para acrescentar alguma coisa, para agregar valor a este mundo. Para ser simplesmente algo maior e melhor do que foi ontem."


De bem com Deus

Penso em pessoas que freqüentam a missa apenas para ficar de bem com Deus. Recitam orações distraidamente, olhando para o lado, sem perceber o significado das palavras. Quando a gente se concentra fervorosamente na oração, cria uma ponte com o Divino, transformando o corpo físico e o ambiente em energia.

Tecer críticas improdutivas durante o sermão, criticando outras seitas, por exemplo, quebra a corrente da energia que emana do sagrado ritual da missa, que tenho profundo respeito. Penso então que sacerdotes devem utilizar sermões como inspiração para a auto-reflexão e autoconhecimento dos fiéis.

Crenças e atitudes

"A religião tem mais a ver com atitudes do que com crenças", acredita Karen Armstrong, historiadora da religião e ex-freira católica, autora da obra "A grande transformação". Após cinco anos de pesquisas minuciosas, Armstrong descobriu que, no coração das maiores religiões do mundo, existe a crença comum de que a compaixão é a chave da consciência espiritual. "Não é aquilo no que você acredita, mas sim como você reage, que conduz à iluminação", diz a historiadora inglesa em artigo publicado na Folha de 26/3/2006.

"Em todas as religiões há transcendência. Todas têm o objetivo de tornar seus praticantes melhores, mais pacíficos, compreensivos e sábios", admite, na Folha de 2/4/2006, Tenzin Gyatso, o Dalai Lama, chefe supremo da religião budista, residente no Tibete.

Se você entra em uma igreja, o que vê lá? Não vida, mas morte, e Jesus crucificado na cruz completa a tristeza geral, escreve Osho em "Um pássaro em vôo". Você pode rir em uma igreja, dançar em uma igreja, cantar em uma igreja? Sim, o canto está ali, mas é triste, e as pessoas sentam-se com expressões sombrias, observa o escritor.

"A menos que você renasça, não entrará no reino de Deus", disse Jesus. Eis o verdadeiro propósito das religiões: a transformação natural de seus praticantes em seres humanos melhores.

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